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POR QUE ESTUDAR é tão difícil? Como a SOCIOLOGIA ESTRUTURAL DE BOURDIEU pode te AJUDAR a entender?

Atualizado: 17 de nov. de 2023

Você provavelmente já ouviu a famosa frase de Bourdieu, dita no sermão dado pelo professor Clóvis de Barros Filho durante uma aula sobre Kant, na Mackenzie:

“les circuits de consécration sociale, sera d'autant plus efficace plus la distance sociale de l'objet consacrée”

A qual pode ser traduzida em “Os circuitos de consagração social serão tanto mais eficazes quanto maior a distância social do objeto consagrado”.

O que simplificando a grosso modo, seria o mesmo que dizer que quanto mais distante a pessoa que elogia você, maior o valor social deste reconhecimento, assim, o elogio de sua mãe, tem menos valor do que o elogio de seu professor, o que por sua vez tem menos valor do que o elogio do reitor e assim por diante.





Posso arriscar que no Brasil, não temos tanta familiaridade com grande sociólogo francês Pierre Bourdieu, exceto por essa referência rápida feita pelo grande mestre Clovis de Barros Filho ao falar sobre “brio”, vergonha na cara, diante das choramingas de seus alunos ao se deparar com um texto difícil de Kant.

Pensando nisso, hoje o canal método e valor vai falar de forma mais aprofundada para você compreender as ideias deste grande sociólogo. Talvez um dos maiores pensadores de nosso tempo.

Esse vídeo deu um bom trabalho, pois me preocupei em assistir as entrevistas e aulas do sociólogo com a finalidade de evitar distorções de interpretações e trazer o melhor conteúdo para você. Não fizemos esse vídeo pela audiência, pois infelizmente o brasileiro não dá tanto valor as brilhantes ideias de Bourdieu.

Fizemos para levar conhecimento aos aventureiros que tiveram a curiosidade de saber mais sobre o sociólogo francês.

Pierre Bourdieu nasceu em 1930 e faleceu em 2002. De nacionalidade francesa, é considerado um dos maiores sociólogos do século XX. Ele se destaca por ter renovado as ideias de autores clássicos como Durkheim, Weber, Lévi-Strauss e Mauss, criando um verdadeiro sistema teórico para interpretar a sociedade.

Ao contrário do que algumas pessoas dizem, Bourdieu não é adepto das ideias Marxistas. Como o próprio sociólogo declarou em entrevista, ele possui uma personalidade de nadar contra a maré, longe do modismo, então enquanto os intelectuais de sua época se debruçavam sobre Marx, ele preferia Weber, e assim construiu sua reputação de ser do contra.

Bourdieu, foi o pioneiro a tentar demonstrar de que modo as estruturas sociais se conectam com a vida prática de cada indivíduo. Para ele, ‘Não existem ideias puras’, logo os gostos pessoais e os comportamentos das pessoas têm a ver com a posição, valores e ambiente que elas ocupam na sociedade, ou seja, na estrutura social e suas implicações complexas.

Para melhor compreender as ideias de Bourdieu, vamos explicar primeiro os três conceitos importante sobre a sociologia estruturalista do sociólogo, os quais se conectam:

  • O primeiro deles seria o “capital”.

Para Bourdieu, diz respeito aos recursos que um indivíduo possui que lhe fornece vantagens e privilégios em relação àqueles que não os tem, se subdividido em capital econômicos, culturais ou sociais.

Desta forma, o capital econômico é a quantidade de recursos financeiros que uma pessoa dispõe na forma de propriedades, dinheiro e bens materiais;

já o capital cultural, diria respeito a recursos adquiridos na instituição escolar como linguagem erudita, domínio da oratória, livros, diplomas e notas altas em provas.

Enquanto o capital social se resumiria a rede de relacionamentos sociais e contatos que uma pessoa possui que lhe confere vantagem sobre os demais.

  • O segundo conceito estruturante seria o “Campo”.

O campo está intimamente ligado ao de capital porque este é definido como uma rede ou uma configuração de relações sociais que são organizadas em posições de dominância diferentes.

Assim, para Bourdieu, qualquer espaço social em que há uma correlação de forças desiguais em termos de capital – econômico, cultural ou social – entre diferentes pessoas pode ser considerado um campo. Inclusive ele dá como exemplo, que até a área da literatura é um campo, assim como a política, a ciência, ou a escola.


Por fim, temos o conceito de “Habitus”.

O conceito de “habitus” se refere a forma como as pessoas aprendem e reproduzem aquilo que aprenderam durante o seu crescimento dentro de uma sociedade, passando a assumir os pensamentos de sua época. Assim, o “habitus” é a experiência social incorporada em nossas mentes. Cada pessoa ocupa uma posição diferente no campo e herda ou adquire determinados capitais ao longo da vida, o que a torna única.

Após compreender que as pessoas nascem e constroem diferentes capitais ao longo da vida, e que isso está diretamente conectado com os espaços sociais que travam essa batalha e com a sua capacidade de aprender e absorver as características e valores de sua época, da região e da cultura.

Vamos passar para alguns dos pensamentos de Bourdieu sobre aspectos e temas relevantes de nossa sociedade.

Ao ser questionado sobre o que seria a violência simbólica e a correlação com a educação, o sociólogo afirma que as estruturas sociais tendem a se conservar. Assim, a política e a ideologia dominante em uma sociedade em determinada época são transmitida e moldam o indivíduo através das instituições de controle social.

Esses sistemas aceitos como normais e comuns por todos dentro da sociedade impõe de forma sutil, mecanismos que buscam reafirmar as estruturas sociais. Assim, o autor vai falar sobre o papel das escolas e o sistema de ensino neste contexto de preservação das ideias conservadoras.

Mas o que são essas ideias conservadoras?

Para autor, seria toda ideia que busca preservar uma certa ordem social, mantendo um sistema sucessório, ou seja, se minha família detém patrimônio, poder, prestígio e posição social, a tendência é que eu transmita para as instituições como escola, mídia, família e produções intelectuais, ideias e métodos de ensino, que mantenham os demais em suas posições sociais e que me permite ter uma vantagem sobre os demais.

Aí derivaria nas escolas a existência de grades curriculares com matérias específicas para uma determinada formação dos alunos, sistemas de avaliações como provas e notas. Esses mecanismos exercem, segundo Bourdieu, uma violência simbólica no indivíduo.

É por isso, que o sociólogo afirmava que o sistema de ensino serve para conservar e perpetuar as estruturas sociais, através de um modelo sucessório, ou seja, o capital vira capital. Ele se perpetua entre gerações, através sistema de ensino.

Neste contexto, a família é um meio de transmissão importante dessa conservação. Elas ratificam essa ideologia, quando aconselha os filhos a seguir essa métrica com fidelidade e subserviência.

Bourdieu, chega a fazer a seguinte exemplificação:

“A escola diz que uma criança é boa de matemática sem buscar saber que na família dela há cinco gerações de matemáticos. Da mesma forma, a escola condena uma criança como ruim em línguas sem nem mesmo considerar que ela é filha de imigrantes”.

Assim, a escola contribui, ratifica, sanciona e transforma como mérito escolar as heranças culturais e familiares.

O sociólogo também vai dizer que a predisposição está ligada a trajetória, as origens, características e regionalização do indivíduo, e seria a juventude o momento quando uma pessoa se faz, ou seja, inventa uma versão própria de si.

Para Bourdieu, um movimento perigoso se aproximava da Europa, na virada do século. Pois mesmo com todo o pensamento avançado do povo europeu quanto a importância dos direitos e seguridade sociais, como as invenções de seguro social, proteção social, seguro contra acidente de trabalho, de saúde, uma corrente contrária a estes importantes capitais estavam invertendo o entendimento do povo europeu e os convencendo de que tais direitos de seguridade sociais eram obstáculos ao desenvolvimento econômico e a livre concorrência.

Bourdieu alertou para a construção social reféns de instituições sociais caducas e reacionárias. E como medidas de cortes de direitos e garantias sociais como empregos temporários, privatização do ensino, da saúde, do sistema de previdência e medidas de supressão de direitos trabalhistas, haviam se tornado uma tendência. E como sua previsão era de que até 2030, as consequências começariam a deixar de transparecer, para se tornar uma triste realidade de desigualdade social e violência.

Em uma de suas entrevistas, o sociólogo, chega a afirmar que no Brasil de meados de 1998, já era perceptível o aumento do desemprego e da violência.

Ele ressaltou que pessoas estavam vendendo uma ideia neoliberal – nas favelas e nas comunidades mais carentes. Estas pessoas dizem que essas regiões marginalizadas estão politizadas, exaltam a riqueza da cultura de pobreza nestas comunidades, produzem uma realidade desconexa, mantendo essas regiões na cegueira sobre a desigualdade real.

Para Bourdieu, as pessoas estão expostas todo dia a propaganda do mercado e livre iniciativa do neoliberalismo econômico. Esta propaganda está na imprensa, na educação, na família, nas instituições. A todo momento somos informados sobre a bolsa, os índices Down Jones, sobre as fórmulas para o sucesso.

Assim, estes discursos massivos, trazem uma cresça prejudicial para evolução social, à medida que busca suprimir as proteções dos direitos sociais, com a falsa ideia de que quanto menos direitos sociais, maior a produção de capital e maior o número de empregos gerados, quando na verdade cria-se dogmas, crenças que existem por si mesma, mas que não correspondem à realidade social.

Bourdieu, ao falar sobre a Globalização, ele nos apresenta uma visão central de quatro postulados que são formas um pouco distorcidas da teoria econômica.

Para o sociólogo, a economia é uma esfera isolada, ou seja, separado do mundo do aspecto social e se concentra apenas em produção de riqueza. Este postulado afirma que a economia é governada por leis naturais – o que para Bourdieu, na verdade trata-se apenas de leis culturais e históricas. Portanto, não são universais e naturais. Alguém construiu essa ideia e ela vem sendo usada para distorcer a realidade.

O segundo postulado da economia globalizada, segundo o mestre, é de que o “governo não deve contrariar e nem interferir, assim o mercado e a melhor maneira de organizar as relações socais, os intercâmbios, a produção e também a melhor maneira de garantir uma distribuição justa. Traçando um paralelo entre o mercado e a democracia.

O terceiro postulado é o da globalização que exige uma redução de despesas do Estado e das despesas sociais, ou seja, a ausência total de controle, a supressão de tudo que possa atrapalhar a lógica pura do mercado.

Como consequência, todos os direitos sociais conquistados são suprimidos em nome do lucro e da geração de emprego. A lógica é que custam caro, sem lucro, logo causa prejuízo. Aí nasce o discurso cada vez mais presente de que o Estado do bem-estar social estimula a preguiça, citando que isso é parte de um discurso calvinista.

Bourdieu, fala sobre a obra de Max Weber e a moral norte-americana de poupança e seriedade econômica – como o discurso deles traz uma noção de autoajuda. Ou seja, na opinião do sociólogo seria o lema pessoal de que: “temos que nos virar sozinhos, pois somos responsáveis”. Assim, essa ideia estaria difundida no mundo inteiro, o qual só se fala disso: “o pobre é responsável por si, e pela pobreza que se encontra”. Este é o valor principal. Um discurso para justificar a sociedade, reduzi-la a ideologia de que: “o pobre é pobre porque quer”.

Para sociólogo, a globalização é fruto de um discurso construído e disseminado pelos veículos de comunicação, de forma financiada, é um instrumento de combate ideológico para combater os direitos sociais alcançados, é um mito criado. Assim, teríamos passado da saúde pública universal para os planos de saúde, das escolas públicas para as escolas particulares, da previdência pública para a previdência privada, de servidores públicos para contratados.

Isso somente reforça o discurso, principalmente nas escolas, a medida que aumentam o modelo de conservação e combate á seguridade social. Constroem bases educacionais direcionada para o modelo globalizado dos postulados da economia.

Outra crítica de Bourdieu foi sobre a disseminação de Organizações Não-Governamentais, as quais, segundo ele, estão se tornando o braço esquerdo do Estado, assumindo as funções do Estado na questão de seguridade social.

Elas não são o Estado, mas agem em seu lugar movidas por interesses privados e por pessoas que buscam lucros pessoais, através de subvenções do Estado. Bourdieu cita ainda o trabalho de Yves Dezalay, sobre essas ONGs, e afirma que estas que lideram esses projetos em sua maioria são pessoas de origem sociais altas, que se aliam a população local pouco escolarizadas, com um discurso de que supostamente não fazem juízo de valor das pessoas em situação de marginalização.

Estas pessoas usam o capital social conquistado em razão de sua origem nobre, herdada de seu meio social, e conseguem concorrer com o sistema escolar, chegando até ganhar essa competição, pois eles são modernos, com uma roupagem de métodos abertos.

Com isso, o Estado se afasta e cada vez mais sucateia as políticas públicas de seguridade e assistência social. Enquanto pessoas, fazem dos “voluntarismos” e da “solidariedade” uma lucrativa profissão, subvencionada pelos impostos dos cidadãos.

Bourdieu, traz também uma crítica às pessoas que fazem discursos, jornalismo, teatro, cinema... sem uma preocupação em se aprofundar nas consequências do que propagam. Para ele, essas pessoas não necessariamente preparadas – podem até ser pessoa de bom caráter, mas podem ser incompetentes para lidar com o mundo real. Não é possível que hoje, abstraímos a realidade econômica das questões sociais.

O sociólogo cita um exemplo de um telejornal. Ele pede para fazermos uma análise de como este jornal fala, como ele inicia falando de Copa do Mundo, depois fala por três segundos sobre algo violento e logo está passando a imagem de pessoas miseráveis caminhando pro uma estrada, depois passa 3 minutos sobre algo em Kosovo.

Bourdieu, chega a afirmar que é “história do louco contada por idiota”. Assim temos uma série de acontecimentos sem ligação entre eles - sem lógica interna. Ninguém sabe de onde vem e para onde vai.

Um dos objetivos da mídia é o imediatismo da notícia. Nem se tenta ligar os fatos. Tudo é atrelado apenas ao que acontece hoje, desprezando-se os processos e os contextos.

Mostram imagens rápidas em um encadeamento e de forma manipulativa, e ainda, para Bourdieu, o mais grave: isolam a imagem de seu contexto. O que torna inteligível a mensagem. A televisão tenderia então, a despotencializar, tornar banal, os absurdos do mundo.

Segundo o sociólogo, uma coisa é fato, é que o descrédito do povo pela política é em grande parte pelos cortes rápidos e descontextualizados das facetas políticas propagados pela imprensa. Ela busca pequenas frases e expõe como se tudo fosse apenas truques, resumindo todo o trabalho por traz do complexo processo que é administrar um país, como algo idiota e simplista. Ele afirma que a TV despolitiza a população. O jornal quer fazer fofoca, não se preocupam em estudar o problema, e essa exposição leva a conflitos as vezes nem existentes.

Bourdieu ainda fala sobre o crescente peso do veredito da mídia, e como isso tem se tornado um veículo de propagação de tradições fechadas. O sociólogo chega a explicar a notoriedade cientifica concedida pela mídia nos últimos tempos e como isso permite que alguns, não necessariamente os melhores pontos de vistas, obtenham vantagens competitivas: subvenções e créditos, por exemplo.

Todo universo da produção está cada vez mais dominada pelo problema da comercialização – existe uma ação quase que conjunta, um lobby formado entre mídia e pequenos intelectuais para degradar o Estado e algumas instituições. A TV constrói ideais políticos fortes, ela produz as ideias de consumo de massa.

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