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Maquiavel: A arte de se enganar | Introdução às Ideias de Maquiavel em 'O Príncipe'

Atualizado: 28 de nov. de 2023

“Todos os estados bem governados e todos os príncipes inteligentes tiveram cuidado de não reduzir os nobres ao desespero, nem o povo a um estado de insatisfação.

Você provavelmente já ouviu essa frase em algum lugar, se não ouviu fique conosco pois hoje vamos responder questões como: quem foi Maquiavel? Qual foi o cenário político em que ele escreveu "O Príncipe"? Qual a ética por trás deste livro? Por que seu nome ficou associado à perversidade e à falta de escrúpulos? Quais são as suas ideias centrais? 


Você sabia que a frase "os fins justificam os meios" não existe em nenhuma obra do nosso grande Nicolau Maquiavel? E que essa frase, na verdade, é apenas uma definição da obra dita por estudiosos da obra dele a ao longo dos séculos? 


Ficou curioso para entender tudo sobre este político irreverente? Deseja arrasar nas conversas sobre política ou na redação do Enem? Então fique conosco. Já deixa o like aí para ajudar o canal e porque ler Maquiavel ficará muito mais fácil a partir de agora.


Antes de começar, entenda que Maquiavel não foi o primeiro a ter as ideias escritas em seu livro o Príncipe. Na verdade, Maquiavel já estava inserido no contexto do movimento cultural, econômico e político, surgido na Itália no século XIV, conhecido como Renascença. 


A região da Itália neste tempo era o centro político e artístico da Europa, logo o palco, a exposição de ideias, favoreceu muito o pensamento de vanguarda e para o estudo ao longo da história da obra de Maquiavel. 



Compreenda que Maquiavel é um homem de seu tempo e não deve ser lido de forma desassociada da Florença do Século XV, isso é perceptível quando há fatos descritos no livro que são praticamente um recorte de uma matéria jornalística vivenciada pelo escritor, pois muitos destes eventos mencionado não há outros registros históricos. 


Nicolau Maquiavel, tinha bastante prestígio na República de Florença. Contudo, embora tenha servido como funcionário público durante a República de Florença, suas crenças políticas são mais complexas do que uma simples afirmação de que ele era republicano. 


Eis que Maquiavel passa a ideia de que a forma não importa, o importante é a ordem e a segurança coletiva, ou seja, o resultado alcançado pelo Governante astuto. Por isso, suas ideias parecem reconhecer a necessidade de governos monárquicos e autocráticos em certos contextos. Obviamente, até porque na época esta era uma realidade da política e da formação do Estado. 


Contudo, foi a sua proximidade com a República, que o colocou em uma posição política delicada perante a Monarquia dos Médici na época. 


Em Agosto de 1512, devido à invasão espanhola do território da república, a população depôs Sonderini e acolheu os Médici, os quais fizeram uma brilhante e elaborada jogada Política. Maquiavel foi demitido em 7 de Novembro, devido à sua ligação ao governo republicano, retirando-se da vida pública. 


Em 1513, tornou-se suspeito de envolvimento numa conspiração contra o novo governo, foi preso, torturado e exilado. Isso o levou a escrever em poucas semanas sua obra mais reconhecida, praticamente uma bíblia dos políticos e empresários no mundo todo: "O Príncipe".


Curiosamente, Maquiavel escreveu ensaios, discursos e contos, como "Relatos sobre os fatos na Alemanha", "Retrato das coisas da França" e "Discursos sobre a primeira década de Tito Lívio". Mandrágora, Porém, nenhum deles foi tão lido quanto seu escrito mais descompromissado em relação ao engajamento.


Segundo o historiador Renato Janine Ribeiro, após ser preso, torturado e exilado, já durante seu banimento, Maquiavel, entre jogatinas e a vida campestre, escreveu "O Príncipe", um livro baseado em estudos sobre líderes de seu tempo e suas experiências enquanto funcionários em Florença.


Em uma carta para um amigo, Maquiavel deixou claro que, como não poderia discutir política como em uma República, ele preferia estar dentro da política, mesmo na Monarquia, do que não poder fazê-la. 


Coincidentemente, embora Maquiavel tenha dedicado o livro a Lourenço II de Médici, não há na obra nenhuma menção ou exemplificação relacionada aos Médici. 


Ao longo de "O Príncipe", Maquiavel menciona várias figuras históricas como exemplos para ilustrar seus pontos de vista. Uma das figuras que ele menciona é César Bórgia, também conhecido como Duque Valentino. César Bórgia era filho do Papa Alexandre VI e foi um líder político e militar durante o Renascimento italiano.


Maquiavel usa César Bórgia como exemplo para discutir a importância da virtù e da fortuna na política. Ele descreve César Bórgia como um líder que utilizou tanto a força militar quanto a astúcia política para conquistar o poder, tendo falhado muito mais pela falta de sorte do que por competência. César Bórgia é retratado como um príncipe que teve sucesso em seus empreendimentos políticos, apesar das circunstâncias adversas.


No entanto, é importante observar que Maquiavel também destaca as limitações de César Bórgia como governante. Ele menciona que, apesar de suas habilidades políticas e militares, César Bórgia foi incapaz de consolidar seu poder a longo prazo e foi eventualmente derrotado pelo infortúnio de sua doença precoce. Isso serve para ilustrar a natureza volátil da fortuna e a necessidade de um governante adaptar-se às circunstâncias em constante mudança.


É importante ressaltar que Maquiavel, embora demonstre certa admiração por César Bórgia, não estava necessariamente endossando as ações dele, mas sim usando-o como um exemplo histórico para ilustrar seus argumentos sobre a política e o exercício do poder.


Mas fica estranho, não acha? Embora não haja comprovação histórica, não passa a impressão de que Maquiavel dedicou sua obra como uma oferta de paz? Como que um pedido para retornar ao governo de Florença com o aval da família Médici?


Comente sua opinião. 


Essa possível atitude de Maquiavel, em buscar a reconciliação, que para nós, meros governados, reflete uma imensa falta de caráter e valores, para ele, segundo sua própria definição,  refletia o exemplo do que ele conceituou como "virtù".


Antes de continuarmos, farei uma breve apresentação dos conceitos de três importantes chaves para compreender as ideias de Maquiavel: Virtù, Fortuna e Prudência. Explicaremos melhor sobre eles. Continuem no vídeo, aproveitem e se inscrevam no canal para fazerem parte de nossa comunidade de intrépidos em busca de conhecimento.


Virtù, presente na obra de Maquiavel, refere-se, grosso modo, à capacidade de agir do indivíduo diante das adversidades, à sua capacidade de vencer, talento, de antever os problemas e as ações do inimigo e sair vitorioso. Esse conceito não se confunde com a ideia cristão ou platônica de virtudes, como compaixão, honra, justiça, empatia, entre outras.


Para Maquiavel, a "virtù" é a capacidade de lidar com a fortuna. A fortuna seria os acontecimentos ao nosso redor, que trazem oportunidades ou infortúnios. Percebemos que a fortuna pode tanto trazer bons acontecimentos quanto maus acontecimentos. 


A Prudência, por sua vez, refere-se à capacidade de manipular os eventos a seu favor. Ela vai além de se manter diligente e receoso. Não se confunde com a definição comum a que estamos acostumados. Ser prudente é entender o contexto em que se está, as malícias do jogo político, as armadilhas que possam existir e saber se preparar para elas sem ser derrotado. 


Contudo, não quero que confunda - Maquiavel não orienta que um líder seja malicioso, imoral ou intolerante, pelo contrário, ele também discutia a necessidade de um governante agir de acordo com a moralidade quando possível, sem comprometer a segurança e a estabilidade de seu governo. O objetivo de agir de um príncipe não é apenas manter seu poder, mas sim, lidar com os fatores políticos como povo, força financeira, títulos políticos, economia, relações externas, ou seja, saber equilibrar as forças de poder para garantir uma sociedade forte nos aspectos político-econômico de seu povo e ordeira.


Por exemplo, se você assistir ao filme "O Poderoso Chefão", perceberá que Don Corleone se encaixa perfeitamente na definição de virtù, fortuna e prudência de Maquiavel. Sua virtù seria a capacidade de construir a segurança ao longo dos anos em seus negócios, de manipular aliados e inimigos, de conhecer seus limites e a força que deveria utilizar. Já a fortuna seriam todos os eventos que o levaram ao topo, muitos dos quais foram infortúnios, como a morte de seu pai, de sua mãe e de seu irmão, além de sua vida como órfão em uma terra estrangeira. Mesmo assim, ele conseguiu jogar o jogo e conquistar amor, respeito e temor. A prudência seria a capacidade de negociação de Don Corleone, suas habilidades políticas e de tomada de decisão, que lhe proporcionaram segurança e respeito ao longo de tantos anos. Ele fez o que era necessário, e as pessoas ao seu redor não sabiam exatamente o que ele fazia, mas aceitavam os resultados, considerando Don Corleone um homem honrado e bem-sucedido na vida, digno de respeito e temor.


Neste ponto, você deve estar pensando que Maquiavel é um indivíduo sem escrúpulos, sem princípios e sem moral. E não o culpo por isso, muitos vídeos e interpretações superficiais atribuem a Maquiavel todo tipo de manipulação, astúcia, enganação e traição. No entanto, meu caro ouvinte, a partir de agora você não será uma dessas pessoas, pois sua visão sobre a obra "O Príncipe" e "Mandrágora" irá mudar.


Maquiavel não escreveu um manual para que os monarcas se perpetuassem no poder, nem para que fossem frios, distantes, traiçoeiros e cruéis com o povo. Pelo contrário, ele escreveu uma obra com base em reis e governantes que foram amados, respeitados e temidos por seu povo, e que conseguiram manter seus reinos por longos períodos, sintetizando seus erros e acertos.


Maquiavel resume tudo o que funcionou até então na política, não um resumo fantasioso pregado pela Igreja Católica e suas virtudes, nem mesmo pelos ensinamentos platônicos dos gregos e romanos, que retratam o que chamamos de "dever-ser", aquilo que idealizamos que deveria ser. Maquiavel escreve de forma direta e crua sobre a realidade buscando entender a política como ela realmente era, reconhecendo as complexidades e os desafios do exercício do poder


Em suas obras, não há defesa do mal, pelo contrário, ele orienta que na política tudo é complexo e dinâmico. Um governante não pode se dar ao luxo de agir dentro da mesma ética que seus governados. Ele deve fazer o necessário para que o povo o respeite e o tema. Se não for possível ter o amor e o temor, é preferível ser temido do que amado. Pois manter a compaixão envolve ceder cada vez mais aos desejos de benevolência exigidos por alguém, o que o torna alvo de enganadores e oportunistas, e impede o julgamento correto dos perigos. No jogo do poder, os aliados mentem e são mais perigosos do que os inimigos, pois nunca sabemos o que esperar de nossos aliados.


Os aliados e os inimigos têm algo em comum: todos desejam estar no seu lugar. Se você não pensar à frente deles, não merece governar. Um líder fraco traz mais tragédias do que benefícios ao povo, e o povo não se importa com o que seu príncipe faz nos bastidores, desde que se sintam seguros e prósperos. O povo quer resultados.


Portanto, Maquiavel afirma que um príncipe deve manter as aparências de que possui todas as virtudes desejadas por seus governados, mesmo que não as tenha. Deve mostrar ao reino inteiro que as possui. E quando não estiver diante do povo, deve ser implacável para alcançar seus objetivos em prol do melhor para seu reino. Isso pode significar quebrar promessas, mentir, usurpar e tomar medidas impopulares. Pois o cenário está sempre mudando, e um governante inflexível está fadado ao fracasso.


Resumindo, nós, como cidadãos, obedecemos às leis por medo das instituições de controle social, por medo de ser presos, por vergonha do que nossas famílias e amigos pensariam, por evitar cometer pecados ou por uma moral social. Já o príncipe não está sujeito a isso. Não há ninguém acima dele. Um país soberano é soberano por si mesmo e pela capacidade de seus exércitos. Para manter sua soberania, ele deve jogar um jogo diferente, um jogo no qual ninguém falará a verdade sobre suas reais intenções, um jogo de mentiras e oportunismo, que exige prudência e sangue frio.


Você percebe a diferença?


Vamos lembrar aqui de um exemplo vivo de traição causada a um presidente por agir dentro da ética platônica e ignorar os ensinamentos de Maquiavel. Em 25 de agosto de 1973, o presidente do Chile, Salvador Allende, escolheu um dos militares que considerava mais leais para assumir a chefia do Exército. Três semanas depois, Pinochet liderou um golpe militar para derrubá-lo e implantar uma ditadura que duraria 17 anos. Pinochet até ofereceu um avião para o presidente fugir, mas uma transmissão de rádio revelou que sua intenção era jogar Allende da aeronave em pleno voo. Allende confiava tanto em Pinochet que, na manhã do dia do golpe, teria dito: "Chamem Augusto, ele é um dos nossos".


Você percebe como a obra busca detalhar as regras para uma liderança vigilante, aquilo que pode significar sua permanência no poder e a capacidade de realizar o que é necessário para melhorar a vida de seus súditos?


Por incrível que pareça, há mais ética em "O Príncipe" de Maquiavel do que nas ideias de Platão em "A República". Isso se deve a uma simples questão: a ética tem como objetivo investigar as ações humanas e seus princípios orientadores existentes. Observe que a ética deve se ocupar de uma investigação honesta sobre como as coisas realmente são, e não como eu espero que elas sejam ou deveriam ser.


Por essa lógica, afirmo a você que a obra "O Príncipe" de Maquiavel é uma visão puramente ética, pois reflete a realidade política de seu tempo. São os processos e resultados que precisamos compreender para lidar com as relações de poder em um governo.


Dito isso, espero ter instigado você a ler novamente a obra e talvez compreendê-la sob uma nova perspectiva. Ela também é importante para que nós, meros governados, prestemos atenção nas manobras políticas e alinhemos melhor nossos interesses ao cenário nacional.

Mas, antes de prosseguir, permita-me explicar um pouco sobre quem Maquiavel foi.


Niccolò di Bernardo dei Machiavelli nasceu em Florença, na Itália, em 3 de maio de 1469, e faleceu aos 58 anos, em 21 de junho de 1527. Ele estava inserido no contexto do Renascimento italiano e viveu durante o governo de Lourenço de Médici.


Seu pai era jurista e tesoureiro de uma província italiana, e sua mãe tinha ligações com uma família nobre de Florença. Maquiavel era o terceiro filho do casal.


Ele estudou latim, ábaco e fundamentos da língua grega antiga. Daí veio a influência da Antiguidade Clássica em seu pensamento, principalmente o conceito de virtù e fortuna, como explicamos acima.


Maquiavel tornou-se um importante historiador, diplomata, músico, filósofo e político italiano.


Ele está inserido no contexto de transição entre a Idade Média e as ideias renascentistas, ligadas à ascensão burguesa, que desempenhou um papel crucial nas demais transformações. As movimentações das cruzadas permitiram o surgimento de rotas comerciais e feiras, o que possibilitou o crescimento de uma classe média não nobre, capaz de articular a formação de Estados Nacionais e se inserir em uma nova economia mercantil. Isso gerou uma luta entre a Igreja Católica e as reformas necessárias para a formação do Estado, resultando em rupturas ideológicas e culturais.


Em 1434, o banqueiro Cosimo de Médici, aos quarenta anos de idade, fez uma entrada exuberante em Florença. Ele queria mostrar que estava de volta à sua cidade, o que foi motivo de infortúnio para seus inimigos, que foram banidos. Ali começou o principado dos Médici, uma grande família burguesa, patrona das artes e das letras, que comandou Florença e depois a Toscana até 1737, com breves intervalos.


Nessa época, segundo o especialista Piccolomini, as repúblicas italianas tinham um regime baseado nos chamados "freios e contrapesos". Isso é uma herança da tradição política romana, cujo principal objetivo é impedir que uma pessoa obtenha o poder supremo. O poder era dividido entre os membros das guildas, que eram corporações profissionais que reuniam banqueiros, comerciantes, proprietários de manufaturas, artesãos, entre outros.


Os Médici não arriscavam fazer alianças abertamente, mas, nos bastidores, Giovanni di Bicci, pai de Cosimo, usou o banco recém-fundado pela família para forjar uma rede internacional de contatos. Além disso, casou seus parentes, tanto homens como mulheres, com membros de famílias mais pobres, mas poderosas. Cosimo seguiu a mesma política, oferecendo empréstimos a cidadãos endividados, de forma que, quando fossem eleitos, apoiassem os interesses dos Médici.


Quando seus inimigos perceberam o que estava acontecendo, já era tarde demais. Os Médici haviam solidificado suas alianças, e o exílio de Cosimo causaria uma forte onda de insatisfação entre a população. Tanto é que, quando ele retornou, foi recebido com demonstrações de júbilo pelo povo. Assim iniciou-se a dinastia da família Médici, que durou cerca de 300 anos na Itália.


O mais interessante é que, segundo o especialista britânico Stephen Milner, mesmo Maquiavel tentando "orientar" e agradar seus algozes, os Médici, com seu livro sobre política e poder, historiadores afirmam que não há evidências de que a família tenha tido conhecimento do livro "O Príncipe". Além disso, o livro foi publicado postumamente. Maquiavel o escreveu em 1513, mas só foi publicado em 1532, com a permissão do Papa Clemente VII.


Os Médici e, principalmente, o Papa Clemente VII nunca valorizaram Maquiavel, mesmo com toda a sua subserviência e tentativas de se aproximar deles durante seu exílio. Em um ato de desespero, Maquiavel tentou dedicar seu livro "O Príncipe" a Lourenço II de Médici, mas tudo que conseguiu, em 1519, foram cargos de menor expressão política e militar, além de ser contratado para escrever a história de Florença para os Médici.


Quanto ao verdadeiro herói admirado por Maquiavel e talvez sua principal referência, podemos citar o Príncipe César Bórgia, conhecido por sua habilidade em governar através do amor e do temor.


Em 1527, Carlos V saqueou Roma e restabeleceu a República em Florença. No entanto, Maquiavel foi excluído dos cargos importantes, ficando apenas com cargos político-militares, pois não recebeu apoio dos Médici e do Papa Clemente VII. Isso foi uma grande decepção para o homem que deu origem ao termo "maquiavélico" para descrever aqueles que buscam poder a qualquer custo.


Embora Maquiavel tenha conquistado muito prestígio no período anterior ao seu exílio de Florença, suas obras "O Príncipe" e "Mandrágora", escritas durante o exílio, ainda são consideradas grandes obras sobre a síntese das estruturas e relações de poder na política.


Ele não pôde testemunhar a unificação da Itália nem se beneficiar de seus próprios conselhos para alcançar a posição política que almejava. No entanto, isso não invalida as importantes lições de suas duas obras.


Mas quais são as ideias centrais de Maquiavel? Vamos falar um pouco sobre o que o autor pensava sobre as regras e comportamentos essenciais para um príncipe manter-se no poder.

Como mencionado anteriormente, Nicolau não se preocupava tanto com como a política deveria ser, como pensavam os teóricos, pois isso era considerado um idealismo tolo. Sua preocupação era com como a política realmente é, a realidade nua e crua.


Para Maquiavel, em primeiro lugar, se quisermos ter uma percepção realista da política, devemos ter em mente que ela é obra dos homens e que existem homens que são maus, miseráveis, egoístas, traiçoeiros, mentirosos, sempre pensando em seu próprio benefício antes de pensar no benefício dos outros. Não que não haja homens que sejam virtuosos e que defendam o bem comum neste meio, mas predominantemente a política é, essencialmente, um jogo de interesses.


Entendeu a primeira ideia? O homem não é essencialmente mal, há homens bons, mas na política você deve estar preparado para lidar com os dois. 


A política deveria ser honesta e virtuosa, mas na prática não é, pois, para um soberano, é interessante que ela pareça ser um lugar de honra e valores elevados. No entanto, essa aparência só tem valor na medida em que convence o povo a manter a ordem e impede que as coisas saiam do controle. A manutenção da ordem social e do domínio sobre inimigos e aliados é a obrigação de um governante, e ele deve usar todos os meios necessários para isso.


Sim, pode parecer absurdo, mas para Maquiavel, um governante deve saber manipular o jogo a seu favor, tomar decisões impopulares quando necessário, ser firme quando preciso e justo quando for conveniente para alcançar seus objetivos.


 Lembra que contamos a você a história da tomada de poder por Pinochet no Chile? Pois é, se Salvador Allende então presidente seguisse os conselhos de Maquiavel, ele teria ficado alerta sobre os riscos de nomear seu suposto amigo, e teria condenado ele por traição e feito dele um exemplo para os demais de forma mais pública e cruel possível. E logo depois, aos poucos tomaria medidas conciliatórias, pequenas migalhas políticas para fortalecer seus laços com os antigos apoiadores de Pinochet, a recompensa, segundo Maquiavel deve ser sempre aos poucos, e em porções pequenas, enquanto a punição para demonstrar poder deve ser rápida e o mais severa possível. Ela deve servir de educador para os que tramam contra você e para os que possam vir a pensar nisso. 


Veja esta citação retirada do livro, em que Maquiavel conta como o Duque César Bórgia evitou uma Guerra Civil e se livrou da má fama pela decisão dura que tomou. 


Ele conta que a província estava cheia de latrocínios, de brigas e de todas as outras causas de insolência. Desta forma Bórgia julgou ser necessário, pacificá-la e torná-la ordeira, ou seja, dar-lhe bom governo: porém, designou Messer Ramirro de Orco, homem cruel e diligente, ao qual deu pleníssimos poderes. 


Ramirro em pouco tempo a tornou pacífica e unida, com máxima reputação. 

Contudo, depois de um tempo o duque [César Bórgia] julgou não ser necessária tão excessiva autoridade, porque receava tornar tal autoridade odiosa, e que isso refletisse nele como Duque. 


Para evitar isso, ele instituiu um tribunal civil no centro da província, no qual toda cidade tinha seu advogado.


Bórgia sabia que a severidade do passado havia gerado neles algum ódio, e queria, purgar os ânimos daquele povo e ganhá-lo totalmente, mostrar que, se alguma crueldade havia sido cometida, não tinha nascido dele como Duque, mas da natureza cruel do seu ministro. 


Assim, Bórgia aproveitou esta ocasião para colocar Orco numa manhã na praça, em Cesena, dividido em duas partes: com um pau e uma faca ensanguentada do lado.”


Perceba que esta citação tem duas lições valiosas: Ramirro confiou na estima do Duque e no poder que pensa ter. Já o Duque o traiu, objetivando evitar uma revolta diante da crueldade usada para emparelhar a ordem na província. 


Com a morte de um homem, César limpou sua imagem perante a população, a população se sentiu vingada e agradecida ao Duque, e a ordem foi restaurada. 


Para Maquiavel, toda ação governamental se justifica pelo critério da eficiência, isto é, na medida em que seja capaz de realizar a tarefa política pretendida para manter a ordem e a paz. Como só o poder pode limitar o poder, o uso da força é necessário.  Segundo o autor, entre ser temido e ser amado, o governante deve, a princípio, desejar ambos, mas, se tiver de escolher entre um dos dois, deve preferir ser temido, dado que o medo é muito mais firme do que o amor. 


O autor também alerta para os perigos dos aliados, uma vez que estamos sempre esperando o pior dos inimigos e atentos ao que está por vir, enquanto nunca sabemos o que esperar dos nossos aliados, a menos que eles desejem ocupar o mesmo lugar que ocupamos. Portanto, é mais sensato desconfiar sempre. Além disso, os aliados sempre querem mais, a cada concessão que você faz, eles desejam ainda mais.


Um governante fraco cede poderes aos seus aliados e compromete-se com seus súditos, dos quais poderá ser necessário quebrar a palavra. Ser moralmente inflexível é sempre um erro para o soberano, pois conduz a nação ao caos. Aquele que governa apenas pela popularidade está fadado ao fracasso, pois precisa apenas parecer virtuoso, mas nos bastidores as regras são outras. Se for preciso usar a violência, deve fazê-lo; se for preciso mentir, deve mentir.


Nenhuma nação deve ser considerada acima de suspeita para um soberano, todas defendem seus interesses. Um exemplo histórico de violação de acordos de não agressão é o Pacto Molotov-Ribbentrop, assinado em 1939 entre a União Soviética e a Alemanha Nazista. Esse pacto foi um acordo de não agressão entre os dois países, mas também continha um protocolo secreto que dividia a Europa Oriental em zonas de influência entre os dois regimes.

No entanto, em junho de 1941, a Alemanha Nazista violou o pacto e lançou uma invasão surpresa à União Soviética, iniciando a Operação Barbarossa. Essa invasão marcou o rompimento do acordo de não agressão e resultou em um conflito brutal entre os dois países durante a Segunda Guerra Mundial.


Outro ponto, podemos destacar que enquanto Churchill buscava convencer a Câmara dos Comuns e apelava para uma retaliação urgente contra a Alemanha, em relação às políticas internacionais falaciosas de Hitler e sua movimentação bélica, os demais países buscavam evitar uma nova guerra e acreditavam que era possível resolver tudo por meio do diálogo. O resultado foi que, enquanto Hitler fingia negociar uma paz com os ingleses, pelas costas o nazismo invadia silenciosamente os países vizinhos à Alemanha, como uma célula cancerígena.


Para Maquiavel uma lição importante é que um governante deve buscar o amor de seus súditos pelos valores que demonstra ter em público. Nesses momentos, ele deve agir de acordo com a ética da igreja e de Platão, parecer um homem de valor, convencer as pessoas de que seu governo é virtuoso e honesto. Porém, quando não estiver em público, deve ser implacável com seus inimigos e estar disposto a fazer o necessário para trazer ordem e segurança ao reino, afastando-se do moralismo platônico e cristão.


Uma nação deve ter bons exércitos, e aquele que possui um exército de mercenários está em maior desvantagem do que um príncipe que possui um exército de homens que o respeitam. Os mercenários abandonarão a batalha assim que perceberem a dificuldade, enquanto os homens que o respeitam farão de tudo pela glória.


Encerramos aqui, espero que tenha tido um panorama geral sobre Maquiavel, o contexto histórico e algumas de suas ideias escritas no livro "O Príncipe". Inscreva-se no canal e não se esqueça de assistir aos demais vídeos da série sobre Maquiavel, onde traremos citações mais importantes do autor e uma análise mais detalhada sobre o livro "O Príncipe", que originalmente deveria se chamar "O Principado", mas a editora preferiu a tradução que conhecemos. O curioso é que apenas o título do livro foi escrito em latim, enquanto seu conteúdo foi escrito em italiano, o que não era comum na época.


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